Por Redação -
O Acre Notícia, 28 de maio 2019
55 detentos morreram nesta
semana em quatro presídios de Manaus. Uma das unidades já tinha sido palco, há
dois anos, do maior massacre penitenciário no estado.
O assassinato de 55 presos em
48 horas é o novo capítulo da crise penitenciária do Amazonas. Há pouco mais de
dois anos, ocorreu o maior massacre em presídios do estado, com 56 mortes,
durante uma rebelião de 17 horas.
Desde então, as autoridades
tomaram uma série de medidas, como o envio de tropas federais e a transferência
de chefes de facção para presídios de segurança máxima. Mas muitos problemas
ainda persistem. Entenda a seguir o que aconteceu desde 2017 e os principais
desafios a serem enfrentados.
O que aconteceu nesta semana?
Uma disputa entre integrantes
de uma mesma facção causou a morte de 55 detentos de 4 presídios em Manaus. Os
crimes foram cometidos entre domingo (26) e segunda-feira (27).
A Secretaria de Administração
Penitenciária (Seap) informou que a maioria das mortes tinham indício de
asfixia. Elas ocorreram nas seguintes unidades:
Compaj – 19 mortos
Instituto Penal Antônio
Trindade (Ipat) – 25 mortos
Unidade Prisional do
Puraquequara (UPP) – 6 mortos
Centro de Detenção Provisória
Masculino (CDPM 1) – 5 mortos
Os primeiros assassinatos
ocorreram no Compaj – o mesmo local do massacre de 2017 – durante a visitação a
presos.
Uma briga nos pavilhões 3 e 5 deixou 15 mortos. As vítimas foram
asfixiadas ou perfuradas com escovas de dentes, que haviam sido transformadas
em objetos cortantes. Familiares presenciaram algumas das mortes, mas, segundo
a Seap, não foram feitos reféns.
Quem são os mortos?
Os nomes dos 15 mortos no
Compaj e dos 40 mortos em outras unidades foram divulgados nesta segunda-feira;
veja a lista. Ainda não se sabe se eram presos provisórios ou já condenados.
Também são desconhecidos os processos que cada um responde ou a relação deles
com grupos criminosos.
Quais são os motivos do
último conflito?
O juiz Glen Hudson Paulain
Machado, titular da Vara de Execução Penal, disse que foi uma briga de poder
dentro da facção Família do Norte (FDN). "Não se trata de rebelião, mas de
disputa interna da FDN. Essa informação foi transmitida pela Seap à Vara de
Execução Penal."
A Polícia Civil abriu um
inquérito para identificar os mandantes e apurar os motivos.
Quais são as facções que
atuam em presídios do estado?
A principal é a FDN, que
domina a rota de tráfico de drogas do Solimões. A FDN se fortaleceu em relação
ao PCC em 2015, após fazer uma espécie de acordo com o Comando Vermelho (CV).
O que as autoridades fizeram
após o massacre desta semana?
Governo estadual:
A Seap fez a recontagem de
presos Cerca de 200 detentos
ameaçados de mortes foram separados dos demais Celas foram vistoriadas, mas
ainda não há informações sobre o que foi encontrado nelas.
Visitações foram suspensas
Criou um gabinete de crise,
com representantes da área de segurança, da Justiça e do Legislativo
Pediu a transferência de 9
presos, que seriam mandantes do massacre, para presídios federais de segurança
máxima
Pediu a extensão da presença
da Força Nacional em Manaus
Governo federal:
O ministro Sérgio Moro, da
Justiça e Segurança Pública, anunciou o envio de integrantes da Intervenção
Penitenciária, que vai ajudar o estado a retomar o controle dos presídios
Moro também ofereceu vagas a
mandantes do massacre no sistema prisional federal
Ministério Público:
Fez 27 recomendações ao
governo do Amazonas, como aumento da escala dos agentes penitenciários e abate
de drones no entorno das penitenciárias
Foram encontradas armas na
vistoria?
O governo do estado ainda não
divulgou um balanço da operação nos presídios.
O que aconteceu em 2017?
O Compaj foi palco, naquele
ano, do maior massacre do sistema penitenciário do Amazonas: foram 56 mortes
durante uma rebelião de 17 horas. Muitas das vítimas foram esquartejadas e
queimadas. Também houve fuga de dezenas de presos. O motim começou no Compaj e
se espalhou para outros presídios, como a Unidade Prisional do Puraquequara
(UPP) e no Centro de Detenção Provisória Masculino (CDPM).
Os mortos eram integrantes da
facção criminosa PCC e estavam presos no Compaj condenados por estupro. A
rebelião foi comandada pela facção rival FDN.
Quais foram as principais
falhas identificadas no sistema penitenciário?
Em dezembro de 2017, o
Ministério Público do Amazonas concluiu em uma investigação que uma série de
falhas contribuiu para a rebelião ter acontecido. Entre as conclusões, estavam:
Falta de uma comunicação
rápida entre a polícia e a Secretaria de Administração Penitenciária, que já
tinha recebido denúncias de que presos planejavam fazer uma rebelião e fugir;
Acúmulo de processos: um juiz
da Vara de Execuções Penais cuidava de mais de 17 mil processos por ano e
concedia benefícios desiguais aos detentos;
Erros do próprio Ministério
Público, que designou apenas dois promotores para cuidar de 17 mil processos e
fiscalizar oito presídios;
Falhas da direção da
penitenciária, que dava regalias para os presos.
Que medidas foram tomadas
naquela época?
A Polícia Civil abriu um
inquérito, que foi concluído 8 meses após a rebelião. Nele, 213 pessoas foram
indiciadas pelas mortes. No mês seguinte, a Justiça do Amazonas decretou a
prisão de 205 pessoas. De acordo com a Justiça do Amazonas, os denunciados
aguardam por julgamento até hoje.
Em 2017, o governo federal
enviou mais de 100 membros da Força Nacional para reforçar a segurança do
entorno dos presídios. Dentro deles, a responsabilidade ainda era do governo do
estado.
A Seap também fez mudanças
nas rotinas dos presos, no sistema de monitoramento e na direção dos presídios.
Em relação à Justiça, a Vara
de Execuções Penais recebeu mais dois juízes para desafogar o sistema. O
Ministério Público dobrou o número de promotores dedicados aos processos de
presos – hoje são quatro.
O que aconteceu com os
mandantes do massacre de 2017?
Dez dias após a rebelião, 17
presos do Compaj, apontados como mandantes da matança, foram transferidos para
presídios federais fora do estado.
Em julho de 2018, Márcio
Ramalho Diogo, o Garrote, foi levado para o presídio federal em Mossoró (RN).
Ele foi apontado como responsável direto pelas mortes, por ter difundido entre
os presos as ordens do chefe da FDN, José Roberto Fernandes Barbosa, o Zé
Roberto da Compensa.
Zé Roberto foi considerado
pelo Ministério Público como o mentor no massacre. Na época, ele já estava
preso por tráfico de drogas no presídio federal de Campo Grande.
Também em julho de 2018,
familiares de Zé Roberto e outros integrantes do seu grupo foram transferidos
para Mossoró. Um deles é seu filho, Luciano Fernandes, e outro, seu primo José
de Arimateia Façanha do Nascimento.
Quem administra os presídios?
A empresa Umanizzare
administra sete unidades prisionais do estado, com o Complexo Penitenciário
Anísio Jobim (Compaj).
Após o massacre de 2017, o
Ministério Público de Contas do Amazonas pediu ao Tribunal de Contas (TCE) a
rescisão dos contratos com a Umanizzare e com outra empresa que administra os
presídios do Estado. O MP havia encontrado indícios de superfaturamento, mau
uso do dinheiro público, conflito de interesses empresariais e ineficácia da
gestão da empresa.
O governo do estado chegou a
anunciar a intenção de assumir a administração dos presídios, mas disse que não
tinha funcionários suficientes. Em dezembro de 2017, o governador em exercício
Bosco Saraiva acabou renovando o contrato com a Umanizzare. O Amazonas pagava a
ela R$ 5 milhões por mês – são R$ 4,7 mil por preso, o dobro do custo médio de
presos no país. Na época, a Umanizzare afirmou que estava cumprindo os termos
de contrato assinado com o governo do estado.
A Umanizzare foi
responsabilizada pelo massacre de 2017?
Em agosto de 2018, a
Procuradoria Geral do Estado (PGE-AM) intimou a Umanizzare a pagar R$ 7.089.000
em multas ao governo do Amazonas, por conta de motins e fugas. Na época, a
empresa disse que iria recorrer administrativamente.
Houve problemas nos presídios
entre 2017 e 2019?
Em dezembro de 2018, um
agente penitenciário foi morto dentro do Compaj em um princípio de rebelião de
detentos. O então secretário de Administração Penitenciária, coronel Cleitman
Coelho, descartou uma situação "sem controle" dentro do presídio.
Naquele mês, 12 agentes de
socialização da Umanizzare que atuavam no Compaj foram demitidos por
"insubordinação". Eles se recusaram a entrar nas celas sem escolta de
segurança, após um episódio de fuga. Um interno havia serrado as grades da cela
216, no pavilhão 1, para pegar dois pacotes, com dez celulares, arremessados
para dentro da unidade prisional.
Um dos funcionários demitidos
disse que, depois da morte do agente penitenciário, a "Seap prometeu que
nós teríamos escolta diária de agentes da Coordenação do Sistema Penitenciário
(Cosipe) dentro do presídio, mas isso só aconteceu nos três primeiros
dias", afirmou. O Seap afirmou que era a falsa a informação sobre falta de
segurança para acompanhar os agentes.
Segundo o Monitor da
Violência, do G1, o sistema penitenciário do Amazonas está 136,8% acima da sua
capacidade. O total de vagas é 3.508, e há 8.306 presos no estado.
G1
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